Tecnologia
O Home, versão da rede social para celulares, mostra que o Facebook depende da mobilidade para ser rentável e ganhar novos usuários – principalmente em países como o Brasil
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Há cerca de um ano, o Facebook
era intensamente criticado por sua apresentação em celulares e tablets.
Seus programas para aparelhos móveis tinham falhas graves. Pior ainda, a
maior rede social do mundo não faturava um dólar sequer com anúncios
exibidos neles. Isso começou a mudar em meados do ano passado. A empresa
passou a exibir anúncios em celulares, reformulou seus aplicativos e
fez mudanças em seu site para ficar mais atraente em telas menores.
Comprou a rede social de fotos Instagram, um dos mais populares
programas para smartphones. Tudo fazia parte de uma nova estratégia da
companhia, de priorizar esses aparelhos em vez dos computadores
tradicionais. Na quinta-feira passada, o fundador do Facebook, Mark
Zuckerberg, subiu ao palco do auditório da sede de sua empresa, em Menlo
Park, na Califórnia, para anunciar a mais nova (e ambiciosa) investida
nessa área: o Facebook Home.
Trata-se de uma versão da rede social para celulares que possuem o
sistema operacional Android. “Há 30 anos os celulares são criados com
base nos programas e tarefas que podemos realizar com eles, em vez de
ter as pessoas em mente”, disse Zuckerberg. “A tela principal é a alma
do telefone e deve refletir quem é o usuário.” Hoje o Facebook é apenas
mais um das dezenas de programas instalados no celular. Com o Home, a
rede social vira a protagonista do aparelho. O programa a transforma na
tela principal do smartphone. Ao ligá-lo, a primeira coisa que se vê no
celular são as mensagens postadas na rede social, sobrepostas a fotos de
amigos que ocupam toda a tela. Ainda é possível acessar os outros
aplicativos instalados no aparelho e uma central de mensagens, que exibe
SMSs e conversas feitas no próprio Facebook. “O Home é o primeiro
produto desenvolvido nessa nova fase. Agora nos guiamos pela ideia de
que a melhor forma de acessar e usar o Facebook é pelo celular”, disse
Cory Ondrejka, vice-presidente de produtos móveis, em entrevista
exclusiva à ÉPOCA pouco depois do lançamento.
Ondrejka é o grande maestro da mudança da estratégia da empresa, que
começou em 2011. Ex-diretor técnico da Linden Labs, empresa que criou o
mundo virtual Second Life, entrou para o Facebook em 2010, depois que a
rede social comprou sua empresa, a Walletin, criadora de sistemas de
dinheiro virtual. No Facebook, o executivo encontrou uma empresa em que o
desenvolvimento de todos os produtos para celulares e tablets era feito
apenas por uma equipe. “Isso não era bom em uma cultura colaborativa
como a do Facebook. Buscamos novos talentos e treinamos todos na empresa
sobre mobilidade”, diz. Ele ainda reconheceu que os aplicativos da
empresa deixavam a desejar e decidiu recriá-los do zero. Ao mesmo tempo,
começou há cerca de um ano a desenvolver o Home. “Ainda temos pontos a
melhorar, mas uma coisa boa no Facebook é que sempre acreditamos que
podemos melhorar e que o trabalho nunca está terminado”, afirma.
Os esforços iniciados no ano passado deram resultado. No último
trimestre de 2012, o número de acessos diários por celulares e tablets
ultrapassou os feitos por computadores. A receita com anúncios exibidos
nesses aparelhos passou de zero para 23% do total. Agora a rede social
espera que o Home a torne ainda mais popular (e rentável) nos aparelhos
móveis. A novidade foi recebida com um misto de ceticismo e elogios. A
princípio, não haverá publicidade no novo programa, mas Zuckerberg
afirmou que isso está em seus planos. No entanto, os consumidores
gostarão de ver anúncios na tela principal do seu aparelho? A forma como
o Facebook fará isso será chave para o sucesso comercial de seu novo
produto.
O celular e o tablet são fundamentais para a rede social se manter
relevante num mundo em que a computação marcha rumo à mobilidade. Em
2011, os smartphones ultrapassaram os computadores em vendas pela
primeira vez. Neste ano, o mesmo deve acontecer com os tablets. Ao mesmo
tempo, esses aparelhos estão se tornando o principal instrumento para
usar a internet. Um estudo consultoria NDP Group mostra que 27% das
pessoas que os compram usam menos seus PCs para navegar e usar o
Facebook. De acordo com análises feitas pela própria rede social, entre
os usuários do Facebook, quem o acessa pelo computador tem 40% de
probabilidade de usá-lo ao menos uma vez ao dia. Quem o acessa por
aparelhos móveis tem 70%. Com um produto como o Home, esse índice sobe
automaticamente para 100%, já que a rede social se torna inescapável.
A mobilidade também é crucial para crescimento do Facebook. Em setembro
do ano passado, a rede social atingiu a marca de 1 bilhão de usuários.
Na época, Zuckerberg declarou que agora os esforços da companhia estavam
voltados para o próximo bilhão. Não será fácil. Os dados mais atuais
mostram que o Facebook conquistou somente 60 milhões de usuários desde
então. Em países onde mais de 80% da população já usa a rede social,
como os Estados Unidos e o Reino Unido, houve uma queda no número de
membros no fim de 2012. Uma pesquisa recente do instituto Pew Research
Center constatou que 27% dos americanos consultados pretendiam passar
menos tempo na rede social. Se crescer muito lentamente ou, pior, parar
de crescer por completo, o Facebook corre o risco de frustrar
investidores, ver o interesse dos anunciantes se voltarem para outros
sites e cair na irrelevância de outras redes sociais que vieram antes,
como o MySpace e o Friendster.
Com 2 bilhões de usuários de internet no mundo, ainda existe muita
gente fora do Facebook, principalmente nos países emergentes. Nesses
locais, a internet móvel será ainda mais importante para o Facebook. “A
internet fixa nos mercados emergentes está concentrada nos grandes
centros”, diz Leonardo Tristão, diretor-geral do Facebook no Brasil. “É
natural que a cobertura móvel tenha um papel estratégico para conquistar
novos usuários. O próximo bilhão virá de lugares como Indonésia, Índia e
Brasil.”
No Brasil, os desafios para o Facebook móvel são ainda maiores. Hoje 67
milhões de brasileiros usam a rede social – num universo de 190 milhões
de habitantes. Desse público, só 30% a acessam pelo celular, abaixo da
média global de 50%, de acordo com Tristão. Há ainda a predominância de
celulares de baixo custo. São 200 milhões de celulares comuns e só 30
milhões de smartphones. Por isso, a empresa criou uma área no Brasil
especificamente para lidar com as operadoras e aumentar o uso pelo
celular. “Muita gente ainda acha que um celular mais barato não acessa a
internet ou que é caro demais”, diz Ricardo Sangion, diretor de
parcerias e mobilidade. “O brasileiro ainda precisa entender melhor como
usar o telefone. Isso leva um tempo.” A área de Sangion chega para
complementar uma estratégia que já contava com uma versão do aplicativo
do Facebook para aparelhos mais simples, lançou promoções em parcerias
com operadoras que não cobram pelo tráfego de dados no acesso à rede
social e até um sistema que permite publicar mensagens por SMS.
Alguns críticos se perguntam quem irá querer um telefone em que o
Facebook é tão proeminente. Ondrejka, o idealizador do Home, está
confiante. “Não se trata de dar destaque ao Facebook, mas ao conteúdo
gerado por seus amigos e outros contatos nele. Quando usam o celular, as
pessoas gastam mais tempo em nosso aplicativo do que em qualquer outro.
Por isso faz sentido criar um produto assim”, afirma o executivo. “A
melhor parte de lançar algo novo é colocar nas mãos das pessoas e ver
onde erramos A companhia entendeu que pode aprender rapidamente e criar
produtos de qualidade. Era isso que eu queria quando assumi esse posto.”
Talvez seja essa mudança, e não a investida na mobilidade, que possa
realmente fazer diferença para uma empresa como o Facebook.
FONTE: Revista Época/Ciência e Tecnologia
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