Arqueologia
Assim como a população comum, governantes tinham de lidar com a fome, dezenas de doenças infecciosas e com os altos índices de mortalidade infantil
À esquerda, crânio pertencente a um indivíduo de
características comuns, quase mediterrâneo (branco). À direita, crânio
de um indivíduo negro, da região da Núbia (1.750 a.C.)
(Universidade de Granada)
Os governantes do Antigo Egito não viviam em boas condições de saúde,
nem eram rodeados pela opulência que se imaginava. Ao contrário, assim
como a população comum, tinham de lidar com a fome, sofriam de
desnutrição e de dezenas de doenças infecciosas e tinham índices
altíssimos de mortalidade infantil.
Opinião do especialista
Julio Gralha
Especialista em Antigo Egito e professor da Universidade Federal Fluminense
Especialista em Antigo Egito e professor da Universidade Federal Fluminense
"A maior novidade do estudo é a descoberta do que os governantes também tinham uma má qualidade de vida, com expectativa de vida apenas de 30 anos — acreditava-se que viveriam até por volta dos 45 anos. Outro dado importante diz respeito à menção sobre os pigmeus. Isso mostra que as expedições egípcias são muito antigas, e que chegavam até a região central do continente."
As descobertas foram feitas pelo projeto Qubbet el-Hawa, realizado em
parceria pelas Universidades de Jaen e de Granada, ambas na Espanha, e
pela Suprema Corte de Antiguidades da República Árabe do Egito. Para o
levantamento, foi escavada a tumba número 33 da necrópole Qubbet
el-Hawa, em frente à cidade de Aswan, cerca de 1.000 quilômetros ao sul
do Cairo. A tumba foi construída durante a 12ª Dinastia (1.939 – 1.760
a.C.), para abrigar os corpos de um dos principais dignitários da região
de Aswan, cuja identidade permanece desconhecida.
O local foi reusado pelo menos três vezes, nas Dinastias 18ª, 22ª e
27ª, e é uma das maiores tumbas da necrópole, com grande potencial
arqueológico, uma vez que abriga ao menos uma câmara que permanece
intacta, contendo três sarcófagos de madeira decorados.
Múmias — Foram encontrados mais de 200 esqueletos e
múmias na tumba número 33. Os resultados iniciais do trabalho revelam
características físicas dos egípcios antigos, e quais as condições de
vida do período. "Embora o nível cultural da época seja extraordinário, a
análise antropológica dos restos humanos revela que a população em
geral e os governantes (classes mais altas) viveram em condições nas
quais a saúde era precária, no limite da sobrevivência", diz Miguel
Botella Lopez, da Universidade de Granada.
De acordo com os pesquisadores, a expectativa de vida mal chegava aos
30 anos de vida, já que sofriam de problemas como má nutrição e
desordens gastrointestinais severas — devido ao consumo de água
contaminada do Nilo. O fato foi revelado porque os ossos de crianças
encontrados não tinham marcas, o que demonstra que elas morreram de
alguma doença infecciosa grave. Na tumba havia, ainda, um grande número
de múmias de jovens adultos, com idades entre 17 e 25 anos.
Pigmeus — Segundo Miguel Botella, as tumbas da
necrópole de Qubbet el-Hawa contêm inscrições que são "de grande
importância histórica, não apenas para o Egito, mas para toda a
humanidade". Na tumba do Governador Herjuf (2.200 a.C.), por exemplo, as
inscrições descrevem as três jornadas que ele fez pela África Central,
durante uma das quais trouxe para casa um pigmeu — essa é supostamente a
menção mais antiga sobre esse grupo étnico.
Outras inscrições relatam relações do Egito com a vizinha Núbia (atual
Sudão) ao longo de um período de cerca de 1.000 anos. Os governantes de
Aswan, local onde foi encontrada uma tumba construída durante a 12ª
Dinastia, também mantinham relações e tinham filhos com a população de
Sudão, país vizinho. Por essa razão, Qubbet el-Hawa é um dos lugares
arqueológicos mais importantes do Egito, não apenas devido às
descobertas já feitas, mas também pela quantia de informações que contêm
sobre saúde e doenças, e relações interculturais em tempos antigos.
O Antigo Egito
ANTIGO IMPÉRIO (3200-2100 a.C.): O período
começa com a unificação de diversas tribos e clãs em um estado único,
dominado por um faraó, que, além de ter o poder político, também é
considerado um deus. Tido como a primeira era de florescimento
consolidado da civilização egípcia, o Antigo Império é conhecido como a
época das pirâmides, onde eram sepultados os faraós. São erguidas as
famosas pirâmides de Gizé.
IMPÉRIO MÉDIO (1975-1640 a.C.): Depois do antigo
império, uma série de revoltas acontecem para tentar diminuir o poder
dos faraós, dando início a um período de fragmentação política. O poder
central volta a ser concentrado no Império Médio, tendo como novo centro
a cidade de Tebas. O Egito passa por um momento de estruturação. Não
acontecem grandes expansões territoriais. Os faraós mantêm relações
diplomáticas com outros reinos na atual Turquia, Síria e Palestina. No
campo social, é no Império Médio que o ritual de mumificação deixa de
ser um privilégio exclusivo dos faraós e passa a ser adotado também por
cidadãos de posses.
IMPÉRIO NOVO (1550-1070 a.C.): É o momento em que o
Egito vive uma grande expansão territorial e se beneficia do
desenvolvimento da arte e da economia. No Império Novo, o Egito controla
boa parte do mundo conhecido à época, uma área que vai do atual Sudão
ao começo da Síria. Reinam alguns dos mais famosos faraós, como
Akhenaton, Tutankhamon, Seti I e Hamsés II. Depois desse apogeu, o
estado egípcio começa a se enfraquecer e é invadido por outros povos,
como os persas.
ÉPOCA GREGA (332-30 a.C.): O domínio grego começa com
a invasão do Egito por Alexandre, o Grande, e a expulsão dos persas.
Após a morte de Alexandre, seus vastos domínios foram divididos entre
seus generais, passando o governo do Egito para Ptolomeu. O centro de
poder muda de Tebas para Alexandria e o Egito vive um período de grande
desenvolvimento científico e econômico. Elementos da vida grega,
inclusive seus deuses, passam a conviver com a cultura egípcia. O último
descendente de Ptolomeu no controle do Egito foi Cleópatra VII, famosa
rainha amante dos generais romanos Júlio César e Marco Antônio. Após ser
derrotada por Otaviano, futuro imperador Augusto, ela se suicidou.
* Fonte: Julio Gralha, professor da Universidade Federal Fluminense
FONTE: Revista Veja/Ciência
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