PEDRO CARRILHO
ENVIADO ESPECIAL À ILHA DE PÁSCOA
No mapa do sistema de entretenimento do voo que partira há mais de duas
horas do aeroporto de Lima, Peru, o desenho do pequeno avião na tela
seguia cercado por milhões de pixels azuis. Apenas uma linha vermelha,
com o trajeto já percorrido, cortava diagonalmente o monitor.
Distância para o destino: 1.850 km. Ainda. Não que o voo seja tão longo
assim. Quatro horas e meia equivalem a um filme, uma refeição e um
rápido cochilo. Mas a impressão que se tem é de estar indo para o lado
errado...
Até lá, nem uma eventual ilha de "Lost", nem Atlântida. Nada. Antes de
tocar a pista do aeroporto de Mataveri, na ilha de Páscoa, a aeronave
sobrevoa nada além da imensidão cerúlea do oceano Pacífico.
Sim, esse é o local habitado mais isolado do planeta. A 2.000 km daqui,
os 67 "vizinhos" da ilha Pitcairn, famosa pelo motim no Bounty e o
povoado mais perto, dão clara noção do isolamento.
Vértice sudeste do triângulo que forma a Polinésia (os outros dois são a
Nova Zelândia e o Havaí), a ilha foi anexada pelo Chile há 124 anos e
hoje é território especial ultramarino do país.
Rapa Nui, como a ilha é conhecida pelos habitantes, dista da costa
sul-americana mais de 3.700 km, o equivalente a dez vezes a distância
entre Fernando de Noronha e o litoral potiguar, e é o ponto de contato
entre a colonização sul-americana e o mundo aquático da Oceania.
Pedro Carrilho/Folhapress | ||
Cavalos selvagens e moais em Tongariki, no sul da ilha de Páscoa; local fica a 3.765 km de Santiago do Chile |
Com 163 km², Rapa Nui é menor que a Ilha Grande, na costa verde
fluminense. A única estrada, em grande parte asfaltada, dá uma volta
parcial na ilha em cerca de 46 km -ou menos de uma hora de carro sem
parar.
Rapa Nui, nome que designa não somente a ilha, como também o povo e a
língua locais, não é nem paradisíaca, como os diversos arquipélagos de
atóis que salpicam a Polinésia, nem o safári darwinista das ilhas
equatorianas a nordeste. É patrimônio da humanidade e um dos lugares
mais intrigantes da Terra.
Mais do que os moais, as estátuas gigantes espalhadas pela paisagem
vulcânica que dão fama à ilha, e os mistérios a eles associados, o que
impressiona é a existência e a perseverança da comunidade em local tão
remoto e com recursos naturais limitados.
E essa sensação de isolamento permeia a estada do viajante na ilha. Seus
5.000 habitantes, dois terços deles rapanuis, vivem quase todos no
único povoado da ilha, a diminuta Hanga Roa, onde fica o aeroporto e que
serve de base para turistas.
Há somente uma farmácia, um supermercado e dois pequenos postos médicos
na ilha, e qualquer problema de saúde mais grave torna necessário
acionar uma ambulância aérea para remover o paciente para hospitais
melhor equipados em Santiago.
Há três escolas, uma delas ensina rapanui, mas curso superior inexiste,
tem de ser feito no continente. Do lado de fora de uma das casas
noturnas da vila, os frequentadores amarram os cavalos e vão para a
noitada.
Editoria de Arte/Folhapress | ||
MUNDO CONECTADO
Todo esse isolamento, no entanto, não é empecilho para o mundo conectado
do século 21. Quando da visita da Folha, a famigerada canção de Michel
Teló parecia estar na cabeça e na ponta da língua dos rapanuis.
É curioso e revelador que a palavra pito na língua rapanui (parente do
maori das Ilhas Cook) tenha dois significados que podem ser
interpretados de forma antagônica: para eles, Te Pito O Te Henua, nome
tido como o original da ilha, é "o umbigo do mundo". Mas a frase poderia
significar "o fim da terra". No fim, é tudo questão de ponto de vista.
Seja qual for o significado, vista de dentro ou de fora, a ilha exala
magia.
FONTE: Folha.com/Turismo
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