Bifaces não clássicos
Apesar das tentativas dos diversos especialistas por elaborar uma
tipologia sobre os bifaces baseada em dados objetivos —especialmente
François Bordes e Lionel Balout, que utilizaram as dimensões como
critério—, numerosos exemplares escaparam, por enquanto, a toda
classificação alheia a considerações ou julgamentos pessoais do
investigador. Por essa razão Bordes criou o grupo dos denominados "Bifaces Não Clásicos", ou seja, aqueles aos que não podem ser aplicados os índices matemáticos.[42]
- Bifaces Nucleiformes: É um tipo de biface de definição muito
delicada, pois, é difícil determinar se se trata de verdadeiros bifaces
ou, simplesmente, são núcleos com arestas retificadas e que, ocasionalmente, possam ter sido utilizados como utensílios. Também poderia tratar-se de pré-formas bifaciais, ou de peças casuais.
Apesar da sua aparência tosca, os bifaces nucleiformes aparecem tanto no Acheulense quanto no Musteriense.
- Bifaces-fendedor[27] : Trata-se de bifaces cujo ápice não é nem apontado nem arredondado, mas possuem um gume terminal relativamente largo, transversal ao seu eixo morfológico. Este gume acostuma ser aproximadamente sub-retilíneo, mas também ligeiramente côncavo ou convexo. Apesar serem bifaces incompatíveis com os índices matemáticos, às vezes são incluídos dentro dos tipos clássicos dado que se trata de formas equilibradas e bem acabadas. Os bifaces-fendedor foram definidos por Jean Chavaillón em 1958 sob a denominação "Biface de bisel terminal" (biface à biseau terminal"[23]), enquanto Bordes simplesmente chamou-os de "machados de mão" (hachereaux[36]); o termo atual foi proposto em França por Guichard em 1966 (biface-hachereau), e em Espanha, em 1982 propôs-se a expressão bifaz-hendidor ("biface-fendedor"), entendendo "biface" como substancial referido ao grupo tipológico ao que pertence, "pelo seu talhe bifacial", e "machado de mão" como adjetivo "pela sua morfologia"; ou seja, que tecnicamente se trata de um biface e morfologicamente recorda o machado de mão,[43] embora a sua personalidade seja completamente diferente:
Alguns autores qualificam-nos de machados de mão,[44] coisa com a que, seguindo a J. Chavaillon, não podo estar de acordo; a técnica de talhe para obter um biface não tem nada a ver com o procedimento de fabricação dos machados de mão |
— ALIME, 1978, op. cit. página 121.
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- Efetivamente, neste caso o politetismo geral do biface, até mesmo o desta variante, choca com o monotetismo tecnológico do machado de mão, por mais que possam coincidir na sua morfologia e na sua função.
- Bifaces em estilo Abbevillense: Este biface toma o seu nome do município francês de Abbeville, numa canteira de margas do terraço mais alto do vale do rio Somme e, em princípio foi associada à cultura Abbevillense, da qual seria o seu fóssil de idade (embora, paradoxalmente, no sítio de Abbeville os bifaces sejam particularmente escassos). O Abbevillense era considerado, até há pouco, o antecessor europeu do Acheulense, embora agora fosse integrado como uma fase inicial, arcaica, deste —se bem que nem sempre aparece no registro estratigráfico—. Do mesmo jeito, comprovou-se que bifaces arcaicos como os de Abbeville podiam dar-se ao longo de todo o Paleolítico Inferior, sem implicar nenhum tipo de referência cronológica nem cultural, por isso, foi proposta a expressão "biface em estilo abbevillense"[6]. Tais bifaces foram talhados exclusivamente com percutor duro, sem retificação alguma sobre as arestas, pelo qual estas são extremamente sinuosas. A sua forma é claramente assimétrica, variada e irregular, geralmente determinada pela forma de seixo que serve de suporte (resulta impossível encontrar dois iguais); têm a base reservada, além de grandes zonas corticais, e são muito grossos.
- Bifaces parciais: Trata-se de bifaces talhados
superficialmente, sem que a elaboração afete mais que a uma pequena
parte do suporte. Porém, com uns poucos golpes a morfologia do biface é
conseguida, quase sempre à custa de escolher um suporte adequado. São
exemplares que, com frequência, estão no limite dos seixos talhados, mas
o seu aspecto geral e o seu acabado induzem a classificá-los como
bifaces.
Por ocasiões foi assinalado que a razão de ser destes bifaces é o arcaísmo da indústria à que pertencem; outras vezes, fala-se de objetos sem terminar; há alguns, por outro lado, que respondem a uma clara economia de gestos:
Uma elaboração tão parcial, mas tão cuidada, acrescentada à morfologia do suporte, permite-nos dizer que se trata de um biface acabado, ao que não talharam mais porque não o precisava, poupando, assim, esforço. |
— Benito del Rey e Benito Álvarez, página 175.[45]
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[editar] Úteis que alguma vez foram associados aos bifaces
Dentro da panóplia
do Paleolítico Inferior, e mais concretamente do Acheulense, os bifaces
constituem um grupo importante, sobretudo nos sítios ao ar livre (pois,
parece ser que, nos sítios arqueológicos em caverna, tais objetos eram mais escassos, ao menos segundo as hipóteses de L. H. Keelley[30]).
Amiúde, os bifaces, devido ao seu tamanho e à sua concepção
tecnológica, separaram-se radicalmente dos utensílios sobre lasca (por
exemplo, raspadeiras, raspadores, furadores, etc.), é por isso que uma
distinção acostuma ser feita entre o que se denomina "grupo de
utensílios sobre lasca" e "grupo de utensílios nucleares". Os bifaces,
os seixos talhados e os picos triédricos seriam utensílios nucleares,
pois é comum fabricá-los sobre seixos, blocos ou nódulos de rocha;
porém, este agrupamento é problemático, pois todos esses tipos foram
fabricados, muitas vezes, também sobre lascas — embora de maior tamanho.
Outra proposta habitual é falar dos utensílios sobre lasca como
"micro-indústria", por oposição ao tamanho geral da denominada
"macro-indústria" —que são os mesmos tipos citados anteriormente, mais
os machados de mão—. De novo surgem problemas, pois há raspadeiras tão
grandes como bifaces (ou bifaces tão pequenos quanto raspadeiras), e o
mesmo ocorre com os demais tipos mencionados. À margem deste, associar
os bifaces com seixos talhados e machados de mão é, desde qualquer
pressuposto, um problema.
- Em primeiro lugar, é verdade que os seixos talhados mais elaborados e os bifaces parciais parecem entrelaçar-se, sendo difícil pôr limites entre ambos. Mas o conceito de seixo talhado não é basado apenas na falta de estandardização formal (própria dos bifaces), mas inclui a possibilidade de não se tratar de instrumentos, mas de núcleos superficiais, coisa impensável nos bifaces (salvo os nucleiformes).
- No caso dos machados de mão a anexação é mais questionável (se couber) —apesar de François Bordes na sua popular tipologia de 1961 metê-los todos no mesmo conjunto— por razões já expostas acima. Ninguém nega que, ocasionalmente, bifaces e machados de mão pudessem servir para tarefas similares, mas o seu conceito tecnológico é diametralmente oposto.
- Os picos triédricos, durante certo tempo foram considerados como uma variante especializada de bifaces. Porém, desde que foram detidamente estudados e classificados,[46] ficou claro que requeriam a consideração de categoria independente.
Outro tipo de associação dos bifaces é a dos "outros utensílios
foliáceos bifaciais" do Paleolítico Inferior e, sobretudo, do
Paleolítico Médio do Velho Mundo, a diferença radica no seu acabado
muito mais fino e muito mais leve, realizado sistematicamente com
percutor mole, e numa morfologia mais especializada que sugestiona uma
função específica, talvez como ponta de projetil ou como faca.[47]. Utensílios bem conhecidos pela literatura clássica especializada podem ser, como exemplo:
- Os utensílios bifaciais foliáceos de Europa Central recebem o nome específico de Blattspitzen. Trata-se, sem dúvida, de pontas própria do Paleolítico Médio com forma foliácea, com frequência biapiculadas e muito planas, tanto que recordam as lâminas de loureiro do Solutreano, e somente é possível diferenciá-las graças ao contexto arqueológico no qual aparecem. As blattspitzen sobrevivem em alguma cultura do Paleolítico Superior e, tal e qual avisa Denise de Sonneville-Bordes, as peças do Szeletense europeu oriental (tanto blattspitzen quanto bifaces micoquenses) poderiam ser o elo que liga a tradição dos objetos bifaciais do Paleolítico Inferior e Médio com os do Paleolítico Superior e seguintes.[48]
- Na África foram encontradas peças bifaciais tanto no Aterense do norteStillbayense da zona centro-oriental do continente.[49] Em ambos os casos trata-se de culturas de tradição musteroide, embora com uma forte personalidade e relativamente tardias: no final da chamada Middle Stone Age africana. Em ambos os casos encontramos objetos de formas diversas, por vezes triangulares, ovais, por vezes foliáceas, bem como com talhe bifacial invasor, mas também monofaciais. quanto no
[editar] A transcendência do biface
Quando, séculos atrás, surgiu o debate sobre a evolução, e sobretudo, sobre o origem do ser humano, muitos recusaram aceitar o parentesco humano com seres inferiores. Os primeiros achados de fósseis humanos, como os neandertais ou os pitecantropos
(toscamente interpretados), pareciam corroborar que descendíamos de
selvagens carentes de inteligência, que sobreviveram apenas graças à sua
força bruta. O biface teve um papel importante para quebrar este
preconceito. As publicações de John Frere, em Inglaterra, e, sobretudo,
de Boucher de Perthes, na França, ao longo do século XIX,
mostravam peças de feitio excelente, equilibrado, cheio de simetria e
de uma grande pureza formal. Tais instrumentos somente podiam ter
surgido de mentes inteligentes —e até mesmo numinosas—, com certo senso da estética:
Tal e qual explica André Leroi-Gourhan[50], para períodos tão remotos é difícil definir o que se entende por Arte,
levando em conta as diferenças psicológicas entre os humanos "não
modernos" e nós. A documentação arqueológica que maneja, leva a
Leroi-Gourhan a assombrar-se frente da rápida progressão para a simetria
e o equilíbrio; assim, reconhece em muitos instrumentos pré-históricos a
beleza no senso mais estrito, que aparece —segundo ele— no curso do
Acheulense, ou seja, muito cedo:
Contudo, muitos autores apenas se referem a peças excepcionais; a
maioria dos bifaces tendem à simetria, certo, mas não necessariamente
despertam um senso estético. Na maioria dos casos são coleções
selecionadas com as peças mais chamativas, sobretudo aquelas coleções
realizadas no século XIX, ou em princípios do XX, quando o
desconhecimento profundo da tecnologia pré-histórica não permitia
reconhecer claramente a ação humana nos objetos mais toscos; outras
vezes são coleções de afeicionados, cujos interesses não são
científicos, pelo qual recolhem apenas a creme, o que consideram mais
salientável, abandonado os elementos mais humildes que, às vezes, são a
chave da interpretação de um sítio arqueológico. Contudo, há sítios
estudados por especialistas de metodologia estrita, onde os bifaces são
abundantes e magistralmente talhados, o que leva a expressar a admiração
que produzem tais obras:
Tal é a perfeição do talhe de alguns bifaces, que, realmente, dá a impressão de que o artista se deleita nele per se, pois, ao menos aparentemente, não acrescenta eficácia a essas peças. De qualquer modo, resta incerto até que ponto era arte ou se era apenas a utilidade dos bifaces o que procuravam ao talhá-los tão finamente.[51] |
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A descoberta em 1998 de um biface oval, de excelente feitio, na Sima de los Huesos de Atapuerca, misturado com os restos de fósseis de Homo heidelbergensis
avivou esta controvérsia. Dado que se tratava do único vestígio lítico
desta seção do sítio arqueológico (que, talvez, pudesse ser um
cemitério), junto com as qualidades da peça, fizeram que recebesse um
trato especial, até mesmo foi batizado como Excalibur e tornou-se numa "peça-estrela". Alguns atreveram-se a considerá-lo uma oferenda funerária,
o cientificamente é impossível de contrastar. Contudo, a consideração
simbólica deste exemplar, em particular, e dos bifaces, em geral,
multiplicou-se nos últimos anos, alimentando o debate e a literatura,
nem sempre científicos.
Como contraponto serve a opinião do professor Martín Almagro Basch:[52]
O que parece ficar claro desta controvérsia, ao menos, é que o biface
pode ser interpretado como um signo de inteligência. Porém, é paradoxal
que, dentro da panóplia Acheulense, o biface seja um dos utensílios
mais simples de fabricar e não requer tanto planejamento como outro tipo
de objetos, geralmente sobre "lasca", muito menos chamativos, mas,
certamente, mais sofisticados.
Conforme exposto mais em cima, os bifaces típicos aparecem faz mais de um milhão de anos.[53] Embora agora seja conhecido serem patrimônio de várias espécies humanas, das quais o Homo ergaster parece ser a primeira; até 1954[54] Todas as espécies associadas a bifaces (do Homo ergaster ao neanderthalensis)
demonstram uma inteligência avançada que, em alguns casos, vai
acompanhada por traços modernos como uma tecnologia relativamente
sofisticada, sistemas de defesa contra as inclemências climáticas
(construção de cabanas, domínio do fogo, roupa de abrigo), certos
testemunhos de pensamento espiritual (primeiros indícios artísticos,
como o adorno corporal, a gravura de ossos, o tratamento ritual dos
cadáveres, o desenvolvimento da linguagem articulada), etc. O biface não
deve ser considerado mais que um mais dos muitos indicadores do
desenvolvimento intelectual dos humanos primitivos.
não houve provas sólidas sobre quem fabricava os bifaces: esse ano, em
Ternifine (Argélia), Camille Arambourg descobriu restos do que chamou
Atlántropo, junto a alguns bifaces.
FONTE: Wikipédia, a Enciclopédia Livre.
Um comentário:
oi é telma mim add no seu blog amigo o link é
http://blogtelmavieira.blogspot.com/
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