Macambira
Seg, 05 de Abril de 2010 14:02 |
Semira Adler Vainsencher
Pesquisadora da Fundação Joaquim Nabuco
A macambira está presente nas caatingas do Nordeste do Brasil, da Bahia ao Piauí. A planta herbácea, da família das Bromeliáceas,
que cresce debaixo das árvores ou em clareiras, possui raízes finas e
superficiais, folhas que podem atingir mais de um metro de comprimento
por vinte centímetros de largura, espinhos duros, e um rizoma que
fornece uma forragem de ótima qualidade.
Em
se tratando de cor, a macambira pode ser verde-claro, verde mais
escuro, verde cinza, violácea ou amarela, dependendo, entre outros
fatores, da umidade do ar e do solo. Em locais mais abertos e expostos
ao sol, a face ventral das folhas pode-se apresentar violácea ou
roxo-escuro.
O
vegetal simples, de raízes superficiais, desenvolve-se nas terras mais
áridas dos trópicos, se alimenta de ar atmosférico e possui umidade
suficiente para resistir às duras secas.
Os frutos, amarelos quando maduros, exalam um odor ativo e
característico, assemelhando-se a um cacho de bananas pequenas. E suas
bagas medem de três a cinco centímetros de comprimento, e têm um
diâmetro que varia de dez a vinte milímetros.
Do
limbo das folhas da macambira, os sertanejos retiram as fibras
aproveitáveis. Com golpes precisos de facão, os espinhos são retirados
e, depois, juntam-se as folhas em grandes feixes, que ficam macerando
durante vários dias. Quando amolecem as partes fermentáveis, as folhas
são retiradas da maceração, batidas, espremidas, lavadas e colocadas em
jiraus para secar ao sol. Todo esse processo exala um forte mau cheiro,
tendo que ser feito bem longe das casas. Caso seja realizado às margens
de rios, os pequenos peixes morrem embebedados.
Existe,
ainda, outro processo para se extrair as fibras da macambira. Trata-se
de um método árduo, através do qual a folha é arrastada sobre o arame de
um aparelho conhecido por tiralinho; depois é esmagada e
passada entre os dentes de um pente metálico, para se retirar toda a
parte mole. A partir daí, as fibras descobertas são lavadas, penteadas, e
colocadas para secar.
Utilizam-se
as folhas da macambira, inclusive, para cobrir casas, sendo essas
amarradas em molhos e, durante uma semana, colocadas para murchar. Em
fase posterior, os molhos são colocados uns juntos ao outros, fortemente
atados com cipós (ou batidos com pregos). Em seguida, da biqueira da
casa até a cumieira, os molhos são dispostos em camadas superpostas, o
que deixa os telhados com ótima aparência.
Uma outra operação, bastante ingrata, é a extração da massa da base dilatada das folhas (capas). O sertanejo corta algumas folhas, no ponto em que começam a se alargar, para alcançar a cabeça da macambira. Várias cabeçassão
amarradas umas às outras, formando-se atilhos que os burros transportam
em suas cangalhas; ou os próprios caboclos carregam nos ombros, quando
não dispõem dos animais. O trabalho de apara é bem árduo: há que retirar os espinhos, recortar as bordas, e fazer a despela, ato que consiste em levantar a epiderme, guarnecida de forte cutícula, com a ponta de uma faca. E as capassão piladas visando separar a fécula das fibras.
A massa bruta é batida, espremida e lavada em água, várias vezes, para retirar o máximo possível do fortume.
Isto tudo deixa as pessoas com os dedos muito feridos, devido à ação
corrosiva daquela substância. Após a decantação, a massa, de cor branca,
é envolvida em um pano, passada em uma prensa rudimentar para escorrer o
restante de água, e colocada ao sol para secar.
Com
a massa, em uma cuscuzeira, os sertanejos fazem um pão semelhante ao de
milho. Costuma-se adicionar um pouco de farinha de mandioca à massa,
para aumentar a liga e diminuir o travo no gosto. A massa também é
comida em forma de pirão, com leite, ou carnes, que advêm da caça de
animais presentes nas caatingas: cotia, gambá, tatu, teju,
veado-catingueiro, preá e aves (pomba, asa-branca,
quenquém e juriti). A massa pode ser estocada de um ano para outro. Em
tempos de penúria extrema, a macambira auxilia a sobrevivência do
sertanejo e dos rebanhos.
Dizem
que, em períodos de secas prolongadas, se ingerida somente com água e
sal, a massa faz inchar. Por essa razão, ouve-se com freqüência a
expressão: “inchado de tanto comer macambira”.
A
farinha da macambira é composta, em sua maior proporção (63,1%), de
amido, uma substância química parecida à da farinha de mandioca, porém
com um teor protéico bem mais elevado, próximo das farinhas de milho e
arroz. Ainda é rica em cálcio, quinze vezes mais alto que o leite, e
três vezes mais elevado que o queijo, sendo uma das farinhas mais
nutritivas do mundo. Em se tratando dos rebanhos, é importante registrar
que, comendo um quilo desse alimento, os animais podem acumular,
até, 248 gramas de gordura. Os vaqueiros ressaltam, além disso, uma
outra vantagem: o gado que come as flores e os frutos da macambira não
sente necessidade de ir ao bebedouro atrás de água.
Por
sua vez, com o farelo do caule da macambira - uma parte bastante
nutritiva da planta - os sertanejos alimentam seus animais domésticos,
tais como galináceos e suínos.
As
caatingas têm sofrido muitas agressões ambientais ao longo dos séculos -
desmatamentos, queimadas, substituição de espécies vegetais nativas - o
que causa sérios problemas à fauna, à presença e qualidade da água, ao
equilíbrio do solo e do clima, e acarreta em estiagens cada vez mais
prolongadas, desertificação e degradação ambiental.
Nos
sertões nordestinos, aquela bromélia possibilita que seres humanos e
rebanhos deixem de sucumbir diante da escassez crônica de água. É uma
das poucas plantas que pode ser aproveitada, praticamente, em sua
totalidade. A macambira representa uma tábua de salvação para as áreas
de sequeiro e, portanto, precisa ser pesquisada e preservada.
Fonte: Wikipédia, a Enciclopédia Livre.
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