Ciência
Arqueologia
Cera de abelha em dente de 6.500 anos revela mais antigo tratamento dentário da Europa
Substância teria sido colocada em canino quebrado para aliviar dor
Ricardo Carvalho
A área marcada em amarelo indica a região onde a cera de abelha foi aplicada no dente, que tem mais de 6.000 anos
(Divulgação)
Um homem na cidade eslovena de Lonche foi ao dentista. Pode não parecer
grande coisa, mas levando em conta que ele viveu há 6.500 anos (quando
Lonche sequer existia), no período neolítico, o fato está sendo celebrado pelos cientistas do Internacional Centre for Theorical Physics, instituto de física em Trieste (Itália) responsável pela pesquisa, publicada na edição desta semana da revista científica PLOS ONE,
que levou a essa conclusão. Afinal de contas, trata-se de uma das
raríssimas pistas de tratamento dental rudimentar na pré-história,
conforme afirma Claudio Tuniz, coordenador dos laboratórios de raio-x do
centro.
Saiba mais
NEOLÍTICOO período neolítico, também chamado de Nova Idade da Pedra, marcou o desenvolvimento da tecnologia humana, em especial a agricultura, a partir do ano 9.500 a.C, no Oriente Médio. É considerado tradicionalmente como o período final da Idade da Pedra.
A equipe do coordenador encontrou traços de cera de abelha colocada num
dos dentes de uma mandíbula pré-histórica. A peça fora encontrada numa
caverna em Lonche, em 1911, quando a cidade ainda fazia parte do império
Austro-Húngaro. "É o primeiro sinal de uso de substâncias para
enchimento de dente no mundo e o mais antigo vestígio de tratamento
dentário na Europa", afirmou Tuniz ao site de VEJA.
Em 2005, antes da mandíbula de Lonche, paleontólogos encontraram no
Paquistão onze molares marcados com pequenas perfurações. Pertencentes a
nove pessoas que viveram entre 7.500 e 9.000 anos atrás, esses dentes
são o mais remoto exemplo de 'odontologia' conhecido. A função que as
perfurações teriam, no entanto, ainda é incerta.
Em Trieste, por outro lado, os cientistas estão confiantes de que a
cera de abelha tinha como objetivo aliviar dores na mastigação. O estado
avariado do canino, o que justificaria a intervenção, se deve
provavelmente ao hábito de as pessoas usarem, naquela época, os dentes
para a confecção de ferramentas e para atividades de tecelagem. Além do
mais, na opinião de Tuniz, o uso de uma substância para amenizar
incômodos revela uma sociedade já com domínio de técnicas mais
sofisticadas. O possível paciente, provavelmente do sexo masculino,
tinha entre 24 e 30 anos quando morreu.
Incertezas - Ainda pairam algumas incertezas em
relação ao dentista de Lonche. Embora os testes realizados em Trieste
indiquem que a cera de abelha e a mandíbula tenham a mesma idade, não se
pode afirmar se o enchimento foi realizado pouco antes ou pouco depois
da morte do indivíduo. Se tivesse sido colocada lá depois do
falecimento, a teoria cairia por terra e a presença da cera de abelha
poderia ser explicada como parte de algum ritual funerário. Claudio
Tuniz, entretanto, duvida que seja este o caso. "Acredito que há 99% de
chance (da cera de abelha) ter sido colocada ali antes da morte. Não
haveria sentido encher o dente de uma pessoa que já morreu."
Registros detalhados de intervenções odontológicas só surgiriam alguns
milhares de anos mais adiante no antigo Egito. Como os dois únicos casos
conhecidos são, segundo Tuniz, os molares do Paquistão e, agora, o
canino de Lonche, o pesquisador espera que as técnicas de raio-x
empregadas agora ajudem a encontrar outros vestígios de dentistas
rudimentares no neolítico. "A mandíbula estava em Triste e só
encontramos a cera de abelha 100 anos depois."
FONTE: Revista Veja/Ciência
Nenhum comentário:
Postar um comentário