24/09/2011
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10h50
Estudo que desafia Einstein sofre críticas
RAFAEL GARCIA
DE WASHINGTON
DE WASHINGTON
No clássico de humor "O Guia do Mochileiro das Galáxias", o escritor
Douglas Adams afirma: "Nada no Universo ultrapassa a velocidade da luz. A
única exceção são as más notícias, que obedecem a leis próprias".
A piada resume o clima de mal-estar com o qual a comunidade de físicos
recebeu o anúncio de que partículas chamadas neutrinos teriam viajado
mais rápido que a luz.
Ontem, físicos que conduziram a observação finalmente fizeram um anúncio
oficial e tiveram de enfrentar o ceticismo dos demais cientistas.
No experimento Opera, um feixe de neutrinos (partículas eletricamente
neutras e quase sem massa) foi produzido no centro de pesquisas
nucleares Cern, em Genebra (Suíça), e enviado até um detector no
Laboratório Nacional Gran Sasso, na Itália, a 730 km. Chegou lá 60
bilionésimos de segundo mais adiantado do que a luz.
E a notícia correu também mais rápido do que a ciência. O anúncio já
havia se espalhado na imprensa anteontem, quando os autores do trabalho
abriram o acesso na internet a um estudo ainda sem revisão independente.
*NO TWITTER *
Só ontem o Cern organizou entrevista coletiva com os físicos, com
perguntas via Twitter e transmissão em vídeo. Dario Autiero, líder do
estudo, mostrou seus resultados com algum esforço para contemplar uma
audiência que incluía de jornalistas leigos a físicos veteranos.
Quando sua apresentação chegou ao vigésimo gráfico detalhando a
metodologia do experimento, a plateia local começou a ficar inquieta.
Alguns físicos já reclamavam que seria preciso ser especialista em
sincronização de relógios atômicos por GPS para tentar compreender como
as medidas eram obtidas no experimento. Jornalistas questionavam se um
aparato de laboratório tão complexo e tão cheio de peças não seria
vulnerável a falhas.
Autiero tentou mostrar que seu grupo de pesquisa levou em conta margens
de erro para todo tipo possível e imaginável de interferência. Os
resultados, afirma ele, permanecem sólidos após seis meses de
rechecagem.
"O sr. levou em conta a rotação da Terra?", perguntou um físico que se levantou na platéia. "Sim", respondeu.
Até a interferência causada por carros no túnel de uma rodovia no caminho dos neutrinos foi considerada.
"Conseguimos que uma das faixas da estrada fosse bloqueada por algum
tempo, mas só teríamos obtido mais precisão nas medições com um bloqueio
completo", disse Autiero. A polícia rodoviária italiana negou o pedido,
mais preocupada com congestionamentos de carros do que com o excesso de
velocidade de neutrinos.
No geral, os físicos presentes respeitaram a maneira como o pesquisador rebateu as críticas mais técnicas.
ELOGIO DE NOBEL
Por fim, Samuel Ting, Prêmio Nobel em Física de 1976, estava presente e
parabenizou Autiero. "O experimento foi feito muito cuidadosamente, com
os erros sistemáticos bem checados", disse.
Elogios à parte, poucos físicos teóricos ficaram satisfeitos. Muitos
acham difícil crer que a relatividade especial, teoria de Einstein que
foi desafiada continuamente por mais de cem anos e sobreviveu a todos os
testes até agora, esteja errada num de seus aspectos mais fundamentais.
É mais fácil acreditar em algum problema em Gran Sasso do que reescrever toda a física do século 20.
Num evento em que jornalistas pareciam ter medo de entrar na discussão,
coube a um representante do Instituto de Física do Reino Unido fazer a
pergunta mais constrangedora: "Vocês têm medo de passar ridículo caso se
descubra que tudo isso se deve a um erro sistemático?".
Autiero respondeu, indiretamente, à pergunta. "Apesar de nossas medidas
terem baixa incerteza sistemática e alta precisão estatística, e de nós
termos alta confiança em nossos resultados, estamos ansiosos para poder
compará-los com outros experimentos", ponderou ele.
Especulações teóricas sobre como explicar a anomalia dos neutrinos já
surgiram ontem, apesar do ceticismo. A mais popular sugere que as
partículas teriam atravessado uma dimensão oculta do espaço, pegando um
"atalho" para chegar mais cedo.
Nenhuma teoria anterior, porém, havia previsto esse tipo de fenômeno.
FONTE: Folha.com/Ciência
Editoria de arte/ Folhapress | ||
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