06/05/2011
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11h13
Chimpanzés falam, mentem e recitam poesias com sinais
DA EFE
O casal formado pelos pesquisadores Deborah e Roger Fouts dedicou toda
uma vida a combater a ideia de que a linguagem é o "último reduto" da
singularidade humana. Os mais de 40 anos de trabalho com chimpanzés
mostram que esses animais não só aprenderam a se comunicar por sinais,
mas também a mentir e a recitar poesia.
Os dois psicólogos, que pertencem ao Instituto de Comunicação entre
Humanos e Chimpanzés da Universidade Washington (EUA), vão se aposentar
dentro de poucos meses e sabem que cumpriram uma missão desmentida por
muitos cientistas --entre eles o linguista Noam Chomsky-- que, durante
décadas, negavam a possibilidade comunicativa aos símios, explicam em
entrevista à Agência Efe.
Os Fouts foram deram seqüência aos trabalhos iniciados nos anos 60 por
outra parceria --os também psicólogos Allen e Beatrice Gardner. A Nasa
(agência espacial dos EUA) cedeu a chimpanzé Washoe depois que a
pesquisa com "chimponautas" acabou.
Washoe passou a viver em um ambiente humano, em que só se usava a
linguagem dos surdos-mudos. Um cenário muito diferente comparado com as
equipes que, décadas antes, tentaram ensinar a linguagem oral a uma
chimpanzé e, no período de seis anos, só pôde pronunciar (e não
claramente) quatro palavras: "mamãe", "papai", "xícara" e "em cima",
explica Roger.
Os Gardner e sua equipe, da qual Roger Fouts era estagiário, acreditavam
que a vocalização dos chimpanzés era involuntária, como o som que um
humano faz ao bater o dedo com um martelo.
Eles apostaram então no movimento natural das mãos (como utilizam os
exemplares selvagens, com dialetos próprios) e decidiram criar Washoe
como uma menina surda, usando a da linguagem de sinais dos Estados
Unidos.
A primata aprendeu mais de uma centena de sinais ao observar como a
equipe se comunicava. Ela se tornou capaz de pedir comida e pedir para
que lhe coçassem, além de expressar conceitos complicados como "estou
triste" ou pedir perdão.
LINGUAGEM TRANSMITIDA
Quando os Gardner decidiram ceder Washoe a um centro de Oklahoma, Roger
não quis deixá-la sozinha naquele laboratório e convenceu o casal para
que a transferissem com ele a Washington, onde daria continuidade a sua
pesquisa até a morte da chimpanzé em 2007.
Em todos estes anos, os Fouts puderam ver como Washoe ensinou a
linguagem a sua "família" --Tatu, Dar e Loulis, uma criação adotada que
aprendeu os sinais sem intervenção humana-- até níveis surpreendentes:
os chimpanzés falavam sozinhos enquanto "liam" uma revista, pois são
capazes de nomear o que veem nas fotografias, como bebida, comida,
sorvete e sapatos.
"Falam como uma família. Se uns discutiam, tentavam apaziguar. Quando
Loulis tirava uma revista de Washoe, ela chamava a atenção dele e lhe
dizia 'sujo'", explica Deborah, que indica que os primatas também sabem
utilizar os sinais para mentir.
Assim é possível identificar em uma gravação o momento em que Dar
convence Washoe que Loulis o tinha agredido e se atirou no chão
encenando e pedindo com sinais a sua mãe um "abraço" --ela repreendeu o
suposto agressor.
O mais surpreendente foi registrado em outra gravação na qual um dos
chimpanzés repetia "chorar, chorar; vermelho, vermelho; silêncio,
silêncio; divertido, divertido", um enigma para a equipe até que um
amigo poeta do casal apontou que os sinais destas palavras eram
similares e que se tratava de uma aliteração da língua de sinais, ou
seja, uma composição poética.
"Há evidências de que os chimpanzés podem aprender os signos, ordená-los
e conversar, com sintaxes, sendo capazes de inventar e ensinar",
explica Roger Fouts.
Apesar de anunciarem que vão se aposentar da universidade para se
dedicarem a seus cinco netos que veem pouco, os pesquisadores reconhecem
que seguirão visitando seus outros "netos" chimpanzés.
"Não podemos explicar que temos 68 anos e nos aposentamos. Então vamos
continuar visitando-os, mas não todos os dias", antecipam.
O casal lamenta que a difusão de suas surpreendentes pesquisas não
tenham servido para deter o maus-tratos a estes primatas, mas acreditam
que esta ideia chegue às escolas e provoque uma mudança de atitude nas
novas gerações.
FONTE: Folha.com/Ciências
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